Como funcionam os Amplificadores de Som?

Os amplificadores de som despertam fascínio e atraem o interesse da maioria das pessoas que se aventuram no mundo da eletrônica…podendo inclusive ser o motivo para alguém decidir entrar neste ramo, como é o caso deste que vos escreve 🙂

Apesar de à primeira vista os amplificadores de som parecerem realizar mágica ao transformar um sinal elétrico vindo de instrumento musical, computador, CD player, etc, em um áudio de alta qualidade que nos agrada os ouvidos. Não há, contudo, nenhum mistério na estrutura desses equipamentos. Neste artigo, vamos desvendar as estruturas que constituem um amplificador de som e entender como cada uma contribui para o desempenho do amplificador. 

1 - A estrutura básica de amplificadores de som

Os amplificadores de som são equipamentos construídos para receber um sinal elétrico de pequena amplitude em sua entrada e amplificá-los em tensão e potência, para poder acionar na sua saída um alto-falante, ou seja, uma carga de baixa impedância (normalmente na ordem de 4 a 8 Ohms). Atualmente, podemos encontrar duas tecnologias bem distintas de amplificadores de áudio:

  • Os amplificadores lineares – que utilizam transistores ou válvulas como elementos ativos, mas que operam estes elementos em suas regiões ativas, ou seja, como fontes de corrente controladas;
  • Os amplificadores chaveados – que utilizam transistores MOSFET operando como chaves estáticas (liga/desliga). 

Neste artigo iremos focar nos amplificadores lineares a transistor, por que são os circuitos mais conhecidos.

Estágios de amplificação

Os amplificadores de som lineares são construídos a partir de estágios amplificadores transistorizados, como os circuitos Emissor-comum, Base-comum e Coletor-comum, normalmente estudados em cursos de eletrônica básica. Contudo, não existe um único amplificador transistorizado que consiga realizar as funções esperadas de um amplificador de som. Assim, esses equipamentos utilizam múltiplos estágios para atingir o desempenho desejado. Comumente, utilizamos três estágios:

  1. Estágio de entrada, ou estágio diferencial;
  2. Estágio amplificador de tensão;
  3. Amplificador de potência.

Antes de mais nada, é importante mencionar que a realimentação negativa em amplificadores de som afeta todos os parâmetros de desempenho dos estágios de amplificação, melhorando-os. Contudo, amplificadores de alta performance buscam definir cada estágio com uma estrutura que vai otimizar cada parâmetro de desempenho. Portanto, um bom projeto de amplificador não fica dependente apenas da “boa ação” da realimentação negativa.

2 - O Estágio de Entrada (Par diferencial)

O estágio de entrada de um amplificador de som é responsável por receber o sinal de entrada do amplificador e também fornecer um ponto para a conexão da realimentação do circuito. Nesse sentido, a estrutura deste estágio é o par diferencial, como o ilustrado na Figura a seguir.   

Estágio de entrada de amplificadores de som
Exemplos de Estruturas de Par Diferencial com TBJ.

Como percebemos, o par diferencial possui dois amplificadores interligados. Normalmente, o amplificador é do tipo Emissor-comum, Fonte comum ou Cascode conectados. Os transistores dos dois amplificadores têm o seus terminais de Emissor/Fonte conectados e uma única fonte de corrente polariza todo estágio. Primeiramente, caso ambas as entradas do par diferenciais sejam nulas, a corrente de polarização se divide igualmente entre os braços do par. Assim, nessa condição, o ganho de tensão será também nulo. Agora, havendo diferença entre as tensões de entrada do par, a divisão da corrente de polarização se desequilibra, fazendo surgir um ganho de tensão no circuito.

Parâmetros de desempenho de um par diferencial

O par diferencial é responsável por um conjunto de parâmetros de desempenho de um amplificador de som, sendo eles:

  • Resistência de entrada – Obviamente, por ser o circuito de entrada, o par diferencial afeta a resistência de entrada do Amplificador. Normalmente, amplificadores com altíssimas resistências de entrada usam transistores FET no par diferencial. Contudo, como esses transistores reduzem o ganho e banda passante do amplificador, em áudio é mais comum encontrar pares diferenciais a TBJ com degeneração;
  • Tensão de Offset – O par diferencial também influencia diretamente a tensão de offset de saída do amplificador;
  • CMRR (Razão de Rejeição de Modo Comum) – A tensão de modo comum de um circuito é igual à média entre as tensões de entrada. Dentro da categoria de sinais de modo comum indesejados, podemos colocar, por exemplo, variações de tensão no terminal de terra e ruídos eletromagnéticos. Um dos principais objetivos do par diferencial é exatamente rejeitar esses ruídos, ou seja, oferecer para eles um ganho muito, muito baixo. O CMRR, por outro lado, é um parâmetro que mede a razão entre o ganho diferencial do amplificador e este ganho de modo comum. Portanto, desejamos um alto CMRR para um amplificador de áudio. Uma forma de garantir isso, no entanto, é usar fontes de corrente de alta resistência de saída e carga ativas.
  • PSRR (Razão de Rejeição de Ruído de Fonte) – Todo amplificador é alimentado por fontes de tensão c.c.. Contudo, essas fontes c.c. não são ideais e trazem ruídos ao amplificador. Por exemplo, o ruído de 120Hz de um retificador. Esse ruído contamina a corrente de polarização dos estágios do amplificador e são amplificados pelo circuito. Portanto, a razão de rejeição de ruído de fonte ou Power Supply Rejection Ratio (PSRR) mede a capacidade do amplificador de rejeitar esses ruídos. Esse parâmetro é fortemente influenciado pelo par diferencial. Podemos elevar o seu valor, principalmente pela escolha de uma fonte de corrente de polarização adequada e usando cargas ativas na saída do par;
  • Ganho global – O par diferencial provê ao sinal de áudio um primeiro nível de ganho de tensão. Comumente, entre 10 e 20% de todo ganho do amplificador de som vem do estágio de entrada;
  • Banda Passante – A banda passante define a faixa de frequências em que sinais de áudio são amplificados, sendo que fora dela, os sinais são atenuados. O par diferencial juntamente com o segundo estágio, definem a frequência de corte do amplificador;
  • Slew Rate – O Slew Rate mede a máxima variação do sinal de saída que o amplificador consegue entregar. Portanto, é um parâmetro importante, uma vez que ele define a dinâmica do equipamento. Amplificadores com baixo Slew Rate distorcem sinais de alta frequência (agudos) . O Slew Rate também depende tanto do estágio de entrada, quanto do estágio amplificador de tensão.

3 - O Estágio Amplificador de Tensão

O Estágio Amplificador de Tensão (VAS – Voltage Amplification Stage), é o segundo estágio de amplificação de um amplificador de áudio. Esta estrutura, como o próprio nome indica, é a principal responsável pelo ganho (em malha aberta) do amplificador. O ganho do amplificador deve ser o maior possível, pois assim, com apenas uma malha de realimentação bem simples, o amplificador apresentará alta fidelidade. O VAS responde por 80% a 90% do ganho global do amplificador. Nesse sentido, é comum encontrar células de ganho de 80dB a 100dB.

Parâmetros de desempenho do VAS

Além do ganho, o VAS influencia os seguintes parâmetros do amplificador:

  • Slew Rate – Como dito anteriormente, o Slew Rate de um amplificador é definido no ponto de interface entre o primeiro e o segundo estágio do circuito;
  • Banda Passante – A banda passante é determinada pela capacitância equivalente de entrada do segundo estágio e as impedâncias equivalentes de saída do par diferencial e de entrada do VAS. Assim, o estágio de ganho tem forte influência neste parâmetro também;
  • Impedância de saída – A impedância de saída de um amplificador de som é basicamente igual à impedância de saída do VAS dividida pelo ganho de corrente do terceiro estágio. Assim, o estágio de ganho de tensão tem interferência neste parâmetro.

Circuitos básicos do estágio amplificador de tensão

Os circuitos eletrônicos mais comumente utilizados para construir o VAS são a) Amplificador Emissor-Comum; b) Amplificador CC-CE; c) Amplificador Cascode e d) Amplificador Bootstrap. A figura a seguir ilustra esses circuitos. Comumente, estas células de ganho são selecionadas, pois conseguem oferecer níveis de ganho muito elevados com uma configuração simples. Contudo, as topologias b) e c), além de oferecerem um ganho maior do que um simples Emissor-comum, também proporcionam uma maior banda passante. Já o Bootstrap dispensa o uso de uma fonte de corrente transistorizada para polarizar a célula de ganho, porém, ao custo de uma menor imunidade a ruído.

Estágio de ganho de amplificadores de som
Exemplos de Estágios de Ganho de Tensão.

4 - O Estágio de Potência

O estágio de potência de um amplificador é a estrutura responsável por fazer a conexão da tensão de saída do estágio VAS com o alto-falante. Os principais parâmetro do amplificador afetados por este estágio são:

  • Resistência de saída – O estágio de potência não produz ganho de tensão, ou seja, a tensão na saída do amplificador será igual à tensão do VAS. Contudo, como a impedância de um alto-falante é muito baixa (2 – 8 ohms), o estágio de potência fornece um alto ganho de corrente. Assim, ele faz com que o alto-falante perceba uma resistência de saída do amplificador muito baixa e não gere um efeito de carga, ou seja, uma queda de tensão provocada pela presença de uma carga na saída do circuito;
  • Taxa de Distorção (THD) – O estágio de potência lida com sinais de grande amplitudes (uma vez que o VAS já deu quase tudo o que se precisava de tensão para a saída) e com correntes elevadas. Com isso, as não idealidades e não-linearidades dos transistores de potência começam a ser mais percebidas, produzindo distorção na saída do amplificador. Portanto, a qualidade do estágio de potência vai definir a qualidade de reprodução de áudio do amplificador como um todo;
  • Eficiência energética –   O estágio de potência consome a maior da potência dissipada pelo amplificador. Essa potência dissipada faz com que a fonte de alimentação entregue uma potência ao circuito muito maior do que aquela que o alto-falante vai receber e normalmente vai virar calor. Com isso, por causa do estágio de potência, é necessário usar um sistema de refrigeração (dissipador + ventoinha) mais robusto para evitar que os transistores sobreaqueçam e queimem.

Classes de Amplificação

A THD e a eficiência dos amplificadores de som são dois parâmetros antagônicos, ou seja, se eu projetar o amplificador para ter uma baixa THD, normalmente isto vai fazer com que o circuito dissipe muita potência. Com isso, surgem as classes de amplificação, que são topologias de estágio de potência que buscam encontrar pontos interessantes entre THD e eficiência. A seguir, irei apresentar as principais classes de amplificadores lineares e suas características. Contudo, uma boa leitura para ir mais afundo neste tema é a Dissertação de Rosalfonso Bortoni, que estudou as perdas e dimensionamento dessas estruturas, clique aqui para acessar.

Amplificador Classe A

O amplificador Classe A é uma estrutura de potência que busca produzir a menor THD possível. Para isso, ele usa um transistor de potência que irá conduzir 360º da corrente de carga, ou seja, 100% da corrente do alto-falante. Uma fonte de corrente é utilizada para polarizar o transistor em um ponto de operação que permita essa condução toda. Com isso, a potência consumida da fonte de alimentação é constante. Portanto, quando o amplificador está em “idle” (sem áudio na saída), toda a potência consumida vira calor e quando há áudio, parte dessa potência é entregue ao alto-falante. 

De qualquer forma, a eficiência máxima desta classe é de 25% (teórica) e uns 15% (prática). Note que, uma eficiência de 25% faz com que um equipamento de áudio que entregue 25W ao alto-falante consuma uma potência total de 100W, sendo que os 75W de diferença vão virar calor e precisarão de um dissipador caro, pesado e volumoso para dar conta do recado. Por isso, esse tipo de amplificador é usado apenas em áudio hi-fi ou circuitos com baixíssima potência.

Para maior detalhamento, assista ao vídeo

Amplificador Classe A
Estágio de Potência Classe A

Amplificador Classe B

A amplificador Classe B é construído a partir de uma configuração Push-pull, usando um transistor NPN e outro PNP. A figura a seguir ilustra esta topologia. Observamos que quando o sinal de entrada do estágio de potência for positivo, o transistor NPN será ativado e conduzirá a corrente de carga. Similarmente, quando o sinal for negativo, quem conduz será o transistor PNP. O problema é que se a tensão so sinal de entrada estiver entre +0,7V e -0,7V, nenhum dos dois transistores conduz, produzindo uma distorção chamada de Distorção de Crossover. Consequentemente, isto aumenta a THD do circuito (que será posteriormente reduzida pela realimentação negativa do amplificador). Por outro lado, também reduz a dissipação de potência, já que não há mais uma corrente de polarização. Com isso, a eficiência do Classe B pode chegar até 78% (teórico).

Para maior detalhamento, assista ao vídeo.

Amplificador Classe B
Amplificador de Potência Classe B

Amplificador Classe AB

Os amplificadores classe AB formam a topologia de estágio de potência mais utilizada no mundo do áudio. Como vocês podem ver na figura abaixo, ela também usa uma configuração Push-pull, mas uma pequena tensão de polarização é adicionada ao circuito, com o intuito de, durante o Crossover, manter tanto o NPN, quanto o PNP conduzindo. Assim, o circuito consegue atingir uma THD baixa e comparável ao classe A, mas com muito menos perdas. A eficiência deste amplificador fica na faixa de 40% a 60%, dependendo do ajuste da tensão de polarização.

Para maior detalhamento, assista ao vídeo.

Amplificador Classe AB
Estágio de Potência Classe AB

Amplificador Classe G/H

As classes de amplificação G e H são modificações da classe AB, normalmente empregadas em áudio profissional, ou seja, em amplificadores de maior potência. O objetivo das modificações introduzidas nessas classes é reduzir a perda de potência do Classe AB, por meio da redução da tensão de alimentação efetiva do amplificador. Como os transistores do amplificador Classe AB conduzem (alternadamente) a corrente de carga, ao reduzir a diferença entre a tensão de alimentação desse amplificador e o pico da tensão de saída (sobre o alto-falante), reduz-se a potência dissipada nos transistores e aumenta-se a eficiência do circuito.

Os amplificadores classe G/H possuem mais de uma tensão de alimentação (Vcc1, Vcc2, etc), sendo que a tensão mais baixa é utilizada para alimentar uma amplificador Classe AB comum e as demais fontes são usadas para alterar a tensão efetiva de alimentação do Classe AB, conforme a necessidade. A Figura a seguir, ilustra uma topologia classe G/H e o comportamento da tensão de alimentação em função da tensão de saída.

Amplificador Classe G/H
Estágio de Potência Classe G/H

Principal diferença entre a Classe G e H

A principal diferença entre as duas classes (G e H) está na forma como a variação da tensão de alimentação do amplificador Classe AB principal é feita. O amplificador Classe G utiliza um circuito eletrônico para chavear a tensão de alimentação do amplificador de Vcc1 para Vcc2, assim que o valor de pico da tensão de saída ultrapasse um determinado patamar. Com isso, haverá variações bruscas na alimentação do amplificador, que podem gerar algum ruído no áudio de saída.

Por outro lado, o amplificador Classe H utiliza uma espécie de fonte de regulada que irá tentar fazer a tensão de alimentação ser igual ao pico da tensão de saída mais uma diferença (um “headroom“). Tendo a figura anterior como exemplo, quando a tensão de saída for inferior a Vcc1, os diodos do circuito irão limitar a alimentação do amplificador Classe AB em Vcc. Agora, quando a tensão de saída crescer e Vout+Vzener exceder Vcc1, a tensão de alimentação do Classe AB será proporcionalmente alterada. Assim, o Classe H permite uma modulação da tensão de alimentação muito mais suave, reduzindo problemas de interferência. 

Conclusão

Neste artigo nós discutimos a estrutura básica de amplificadores de som, mostrando os seus três estágios internos, os circuitos mais comuns que encontraremos alí e qual a influência desses circuitos no desempenho do Amplificador. 

Se você quiser aprender mais sobre amplificadores de áudio. Confira o nosso Curso inteiramente GRATUITO : A tecnologia por trás dos amplificadores de potência, disponível no nosso site. Lá, nós vamos a fundo na teoria de cada um desses estágios discutidos no artigo, além de falarmos sobre realimentação e resposta em frequência.

Confira também, os livros a seguir, que ensinam técnicas de projeto de amplificadores de áudio, com um abordagem mais prática e menos acadêmica. 


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